C’est le 13 mai.
Impossível falar sobre perfumaria na França sem passar por Grasse…
Para acompanhar esse capítulo da minha viagem, Xavier Brochet, um amigo de longa data e de muitas experiências perfumadas. Xavier e eu já exploramos Amazônia e o nordeste brasileiro em busca de inéditos ingredientes da biodiversidade brasileira durante os nossos anos de Firmenich, e estar com ele na França trazia a segurança de que a viagem seria muito produtiva para despertar novas ideias. Hoje, Xavier vive em Grasse e é o Líder Global de Inovação em Produtos Naturais pela Firmenich.
Considerada Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO, em 2018, a região apresenta uma expansão significativa contando com novos e pesados investimentos de empresas multinacionais que retornam às origens francesas da perfumaria.
Partimos de Le Rouret, para irmos até os campos de rosas de Fayence , nosso destino principal.
Mas antes, a primeira parada do dia foi no Le château de La Colle Noire.
O refúgio de Dior
Com arquitetura Provençal, esse era o refúgio onde Christian Dior passava seus dias. A propriedade, em Montauroux, é considerada seu “verdadeiro lar”. Nesse movimento de fugere urbem, ele abandonava o seu traje de estilista para cultivar a sua paixão pelas flores excepcionais. A aquisição da propriedade foi a concretização de seu sonho: era ali que Christian sonhava com as flores Dior para os seus perfumes. O château foi revivido em 2013 e hoje pertence à Christian Dior Parfums, funcionando como um laboratório para o atual perfumista-criador, Francis Kurkdjian. O local não é aberto à visitação.
O interesse pela volta à Grasse e locais que marcaram a História da Perfumaria não é exclusividade da Dior, mas sim, um movimento que grandes marcas e Casas de Fragrâncias estão fazendo. Outro exemplo é a aquisição de um terreno para cultivo, bem próximo ao château da Dior, pela Lancôme, além da já tradicional presença da Chanel na região.
Revalorizar a perfumaria, e assegurar o cultivo de ingredientes exclusivos que permitam contar histórias para consumidores curiosos dos bastidores secretos dos perfumes, são os principais motivos por trás da volta à origem da perfumaria, na França. A região é fonte de muitas espécies tradicionalmente usadas nas composições, como a rosa, flor principal dos nossos próximos destinos: os campos de rosas da Firmenich e da Robertet.
Maio, mês da rosa
Não tinha melhor época para essa visita. Além de todos os campos de rosas estarem floridos ao máximo, o clima era festivo comemorando a melhor safra dos últimos 10 anos.
A colheita da rosa de maio, a centifolia, dura um mês e a rotina dos cultivadores é matinal – começa cedo, às 7h da manhã, e termina na hora do almoço. Cada cultivador é capaz de colher uma incrível média de 15kg de pétalas de rosa por dia. De acordo com a Firmenich*, para 1kg de óleo essencial, são necessárias mais de 42 milhões de pétalas de rosas.
Observei com respeito os cultivadores em ação com seus emblemáticos sacos presos ao redor do corpo para facilitar o processo da colheita das pétalas. O jovem Bastien nos guiou nessa experiência e demonstrou a técnica usada para colher a flor, sem quebrar as hastes. O segredo está em apoiar a flor entre os dedos indicador e médio, pressionando firmemente o polegar no miolo. Depois, gentilmente, virá-la para frente até ouvir um click que indica que a delicada ação foi bem feita.
Xavier chamou minha atenção para a abundância de botões de flores em cada haste, chamado de bouquetier (buquê) onde todos esses botões maturam progressivamente ao longo do mês e todas as manhãs novas flores estão maduras para serem colhidas. Com este processo, o ciclo de florescimento durante todo o dia e à noite não desperdiça o potencial produtivo da planta.
O relacionamento com os habitantes de Grasse é um ponto crucial para as marcas de perfumaria. Há mais de 15 anos, a Firmenich, por exemplo, garante o consumo da produção das rosas da família Rebuffel, que nos recebeu e acompanhou a visita.
Próxima parada, o ateliê da Firmenich no berço da perfumaria mundial
Ateliê é um lugar escolhido por conhecedores de um tema para se inspirar, criar e expressar o que sabem sobre ele. O Ateliê de Grasse é chamado Villa Botanica, ele resgata o savoir-faire da perfumaria, realça o caráter artesanal e talento humano. Além de Grasse, a Firmenich abriu dois outros Ateliês, um em Shangai e outro em São Paulo.
Um espaço , super convidativo e muito agradável para receber clientes que confiam o desenvolvimento de suas fragrâncias à tradicional casa Suiça. Na Villa Botanica há um moderno laboratório para que os perfumistas possam refinar as fragrâncias e concretizar as ideias dos seus clientes. Durante a visita conduzida por Xavier, fomos recebidos também por Fabrice Pellegrin, Perfumista Principal da Firmenich.
Um dos pontos altos foi a avaliação de alguns dos ingredientes exclusivos da Firmenich, e compartilho um pouco das minhas impressões sobre essas novidades.
Lilac Firbest. Firbest é uma co-extração de ingredientes naturais e sintéticos, onde alguns deles são cativos Firmenich. Eles ajudam a trazer uma sensação de naturalidade à fragrância. Utilizado recentemente no lançamento de Issey Miyake, A Drop d’Issey Eau de Parfum Fraîche, pela perfumista Ane Ayo. Lilás Firbest é um floral verde potente e cremoso, com floralidade orvalhada.
Bell pepper Green Firgood™. Firgood é um novo método de extração natural sem solvente que usa apenas a água contida nas células da biomassa para produzir perfis olfativos autênticos. De acordo com a Firmenich, é o método mais amigável para o ambiente, resultado de estudos avançados na área de sustentabilidade. O cheiro do pimentão verde vegetal fica muito natural e aquoso.
Osmanthus China Infusion: tradicional maceração de matéria vegetal em álcool. Uma curiosidade sobre a colheita do Osmanthus na China é que lá, ele não é colhido botão a botão, mas sim chacoalhando as árvores e colhendo as flores que caem em uma grande lona. Depois, elas são conservadas em uma salmoura onde maceram de um a três meses antes de seguirem para a extração. Todo esse processo atribui uma faceta única de fruta seca, com acidez aparente quando comparada ao Osmanthus tradicional que tem tonalidade de pêssego frutal.
Esses e outros ingredientes e tecnologias que foram apresentados, evidenciam a busca por alternativas de impacto positivo ao ambiente com tonalidades mais naturais, atendendo a demanda do consumidor que se intensificou no período pós pandemia. A riqueza da paleta de naturais e o expertise na apresentação, foram uma aula pra guardar na memória no berço da perfumaria!
A volta à Grasse
A Firmenich tem uma rica coleção, uma verdadeira fortaleza em naturais, resultado de muito investimento e expertise em diferentes métodos de obtenção.
Com ajuda do Xavier e todo conhecimento que ele generosamente compartilhou, pude concluir, para onde a perfumaria está apontando:
- Para a evolução de tecnologias e diferentes métodos de obtenção cada vez mais amigáveis para o meio ambiente;
- Para fortalecer parcerias de relações humanas para assegurar o fornecimento e a qualidade dos ingredientes no longo prazo;
- Na atenção ao cultivo e ao sourcing dos naturais, praticando a sustentabilidade e criando novos estudos para respeitar a natureza e seus recursos naturais;
- Na manutenção dos fundamentos da perfumaria, principalmente do savoir faire, uma expertise de cada empresa. O “saber fazer”, essa tradição de manter próximas as pessoas que têm um conhecimento muito específico, tão valioso quanto os mais caros ingredientes da perfumaria.
Com mais vivências e inspirações olfativas na bagagem, sigo viagem. Nos vemos na próxima parada!
Au revoir.
Cheirosamente,
Alessandra Tucci.
–
Referências:
*https://www.firmenich.com/product/rose-oil-type-pe-220605-mf